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horas extra

Blog de escrita nas horas extra dos dias

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# Do prazer de uma boa bica tirada à pressão, em tempo de pandemia

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via Buzzfeed.com in Pinterest

Li ontem que provavelmente serão necessários 7 anos para que o Mundo volte à "normalidade", pré-Covid19, dado que só nesse momento é que se prevê que a população esteja toda vacinada.

Habituei-me a ler revistas científicas especializadas, como a Lancet , e a ler os últimos papers de investigadores a nível mundial sobre este "filme de ficção científica" em que vivemos há quase um ano. Ao mesmo tempo, grassam dados e dados económicos sobre as consequências desta imprevista pandemia que nos conduzirá a uma recessão económica agora.

Em Lisboa são muitas as tabuletas de "trespasse", "vende-se loja" ou "fechado por tempo indeterminado" num silêncio que habita agora as ruas, constrastando com o frenesim de 2019 de tuc-tuc, autocarros turísticos, e milhares de turistas pela cidade. Uma economia em superavit em final de 2019.

Leio hoje que há 300 000 pessoas desempregadas em Portugal, 22000 não têm direito sequer ao subsídio social de desemprego. Em paralelo a previsão de 1000 pessoas internadas para a semana por causa deste "bicho maldito".

Em meu redor sei de casos de colegas  e amigos com familiares infetados, isolados em casa, com todo o equipamento covid e de oxímetro em riste, em contagem diária do oxigénio para que não necessitem de ser hospitalizados.

Um batimento cardíaco mais fraco levou uma amiga minha a percorrer hospitais privados que se recusaram a receber a sua familiar infetada por Covid19. Acabou por ir parar às urgências do maior hospital de Lisboa. A cadeira de rodas onde era transportada esta familiar nem sequer conseguia passar para o toldo à porta do hospital pois nem sequer tem uma rampa. Regressaram todos a casa. "É o que há . Se não quer, não quer", foi esta a resposta da funcionária para esta minha amiga perante a sua indignação face às condições de entrada de uma idosa infetada com Covid19.

Esta frase tão laxista é representativa do país em que vivemos, no qual houve dinheiro para Bancos e agora não tem ou não gasta em camas de hospital, médicos e enfermeiros, em ventiladores, em boas condições hospitalares para cada português que desconta ou descontou para a Segurança Social.

Face a este estado da Res Publica só peço que reabram os cafés, eu e muitos levaremos em take-away, e disfrutaremos de um pequeno prazer, trivial, é certo, nestes dias cinzentos de pandemia, de uma boa bica tirada à pressão, cheia e sem princípio.

@marinamalheiro

à Sara

à minha mãe 

 

publicado às 11:57

# Das sementes de violência num país chamado Portugal

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Numa semana em que foram vários os casos de violência contra médicos em centros de saúde e hospitais, veio parar-me aos "olhos" ( Crónica de MEC no Público de hoje) uma reportagem sobre um bailarino homossexual que acabou os seus dias no Hospital Miguel Bombarda em Lisboa por culpa do regime salazarista. Foi sujeito a uma lobotomia- tratamento criado por Egas Moniz que lhe trouxe um prémio Nobel-e foi uma vítima até ao fim.

O antigo "Rilhafoles" foi palco de uma tragédia em 1910,  quando o médico Dr. Miguel Bombarda foi alvejado por um doente "louco", oficial do exército,  2 dias antes  do 5 de outubro.Acabaria por morrer no hospital de S.José. 

Saúde mental e violência são temas pouco abordados em Portugal. Os casos de violência para com médicos, professores são reveladores de uma sociedade violenta e com problemas de saúde mental. Reclamar de um serviço público é possível- está lá o livro de reclamações.

Atirar mesas, cadeiras, partir telemóveis e teclados, esmurrar professoras grávidas, atropelar propositadamente professores, encurralar médicos em gabinetes e feri-los de tal maneira que necessitam de procedimentos cirúrgicos é gravíssimo. Os serviços públicos estão com falta de pessoal, de meios para trabalhar, de boa gestão de serviços ( o Ministro Santos Silva referiu-se aos maus gestores nas empresas, faltam muitos e bons gestores de recursos humanos nos serviços públicos, provavelmente em todos os setores). Hoje um hospital da área de Lisboa está com "constrangimentos"- 9h de atraso para atendimento de doentes com pulseira verde ( menos urgentes), estando os doentes a ser encaminhados para outros hospitais.

O excedente do défice orçamental de Centeno conduz a este caos. Contratando mais pessoal, quer para os hospitais, USF, escolas, serviços administrativos vários do Estado- nomeadamente Segurança Social- e até colocando algo tão simples como cadeiras em Bancos estatais ( estive numa sucursal que tem 6 cadeiras apenas para uma vasta população, a maioria idosa), regularizando processos do Simplex de Mariano Gago, mas, sobretudo, analisando socialmente uma população mentalmente doente , talvez o país entre num rumo "normal". Nada disto é normal. 

Saúde, Educação, Administração Interna , Economia são como "órgãos em falência" num corpo moribundo chamado Portugal. 

Para consulta fica aqui o Relatório da Faculdade de Medicina da Universidade Nova de Lisboa sobre a Saúde Mental e um artigo de Tiago Santos ( 10/10/2019/ Público) sobre o estado da Saúde Mental em Portugal.

@mmalheiro

[Nenhum político deve esperar que lhe agradeçam ou sequer lhe reconheçam o que faz; no fim de contas era ele quem devia agradecer pela ocasião que lhe ofereceram os outros homens de pôr em jogo as suas qualidades e de eliminar, se puder, os seus defeitos.]

Agostinho da Silva

 

publicado às 22:04

# O país da passividade

Ontem num hospital da zona de Sintra esperei com uma familiar direta mais de 10h por um atendimento urgente.

De acordo com o sistema da triagem de Manchester, uma "pulseira amarela" é urgente e uma "pulseira laranja" muito urgente. Ontem o tempo de espera dos "urgentes" foi superior a 10 h. 

Os verdinhos galopavam rapidamente. "Medicina", por contraste, tinha 200 doentes para atender perto da uma da manhã.

Passivamente várias pessoas, maioritariamente de idade avançada, aguardaram a sua vez. Muitos entraram na urgência geral às 10h e saíram à uma da manhã do dia seguinte.

Lá dentro havia médicos em passeio, enquanto doentes esperavam , talvez com uma "capacidade budista". Na mudança de turno houve quem ficasse sem médico atribuído. Doentes dormiam já , não em macas, mas em frios bancos metálicos. Há anos uma familiar minha que tinha um problema cardíaco ficou no corredor deste hospital durante horas, sem assistência. 

Questionei uma familiar para saber se achava este funcionamento "normal".

Quando disse alto mas educadamente que descontamos no vencimento para um atendimento "como deve ser" senti olhares de reprovação. "Ui, uma rebelde".

Foi para isso que foi criado o SNS.O  Direito à saúde é o que está escrito na CRP há mais de 40 anos.

Obviamente quem faz dupla tributação para a SS e ADSE escolhe um hospital privado mas muitas vezes também não há especialidades ou máquinas a funcionar em pleno.

Em França há uma greve geral. Às vezes gostava de ser "francesa".

@mmalheiro

 

publicado às 22:15

# Do ritmo circadiano de um trabalhador

Hoje surgiu a notícia (Fonte:LUSA) de que a Fenprof pediu ao Ministério Público para averiguar a morte repentina de três professores: uma em Manteigas em plena sala de aula, outra na Covilhã em serviço oficial ( corrigia as Provas de Aferição) e outro em Odivelas ( enviava as classificações por email). Como professora considero chocante esta notícia e lamento muitíssimo pelos meus colegas.

Há cerca de 7 meses um familiar meu teve um ataque cardíaco fulminante em pleno local de trabalho , num prestigiado Banco português. Com apenas 53 anos o  excesso de trabalho,- ter muito stress-, foi a justificação dada aos familiares diretos. Colegas que assistiram impotentes à sua hora fatal e tentaram por todos os meios a reanimação estão ainda de baixa psiquiátrica, a família ainda em choque com a perda inesperada.

Tanto no caso dos colegas como do meu familiar o problema é o mesmo: a doença do séc. XXI ,  o burnout.Primeiro, o excesso de trabalho quer a nível de procedimentos burocráticos no caso dos professores- que, muitas vezes se apresenta pela duplicação ou triplicação de procedimentos, nada "simplex" ,  tudo muito inclusivo, com muitas medidas universais, adicionais, etc. Depois, a disponibilidade do professor/ trabalhador- contactável via email, telefone, pessoalmente, fora do horário de trabalho, aos fins de semana, feriados ( obrigada a quem inventou o modo reencaminhamento do email oficial...).

Segue-se o trabalho que se leva para casa. No caso de um trabalhador da área financeira, passa pelo trabalho em modo controlo remoto, fora das horas de expediente. No caso de um professor há também muito trabalho- quer na preparação das aulas, preparação de reuniões, correção de testes de avaliação e todo o tipo de instrumentos de avaliação aplicáveis, correção de provas de aferição, exames nacionais, etc e plataforma informática. Onde fica a vida pessoal? Tem de ser meticulosamente programada como a escala de Bancos dos médicos.

O cumprimento do dever por parte de um trabalhador não é consentâneo com faltas por motivo de doença do próprio, dos familiares diretos ( pais, por exemplo) ou de filhos menores ( até aos 12 anos). Muitas vezes isso é visto como uma fraqueza por parte do trabalhador. Mau para a sua avaliação de desempenho. Por isso, os professores e todos os trabalhadores cumpridores ou entram em burnout ou partem fatalmente. Uma tragédia. 

Há 10 anos numa escola onde dei aulas e donde se avistava a pista 5.2 do Aeroporto de Lisboa lembraram-se de criar aulas de Yoga para professores, depois do serviço. No meu caso não corria muito bem , pois no meio do Ooomm só pensava na lista de compras do supermercado e não desligava. Foi nessa época que comecei a caminhar e a correr, primeiro na pista do Guincho, depois no paredão de Oeiras, fizesse sol ou chuva, seguindo as passadas de Murakami. Há três anos a cardiologista  recomendou-me muita caminhada e melatonina ( na versão natural)- sentir o coração como que a saltar-nos pela boca é aflitivo. Mais do que aflitivo. Responderem-nos-  tive um problema cardíaco - e então?- revela a perfeita desumanidade do meio laboral. 

Eu e muitos colegas não conseguimos este ano, nem correr, nem caminhar, nem esticar as pernas entre testes, reuniões de encarregados de educação, reuniões , papéis, papéis, papéis. Submergidos em papéis.

Valeu-me a alegria dos meus e a noção de que a saúde para viver e para os criar está acima de tudo, até do trabalho.

Aos meus colegas professores

Ao meu primo Xana, in memoriam

@mmalheiro

publicado às 23:33

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